A chegada de um filho costuma ser cercada de expectativas, alegrias e mudanças. Mas também pode abrir espaço para medos, angústias e sofrimento psíquico. Em Montenegro, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) tem ampliado a atenção à saúde mental das mães no período pós-parto, por meio de um atendimento integral que começa no pré-natal e segue conforme a necessidade de cada mulher.
Baseado na Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Mulheres, do Ministério da Saúde, o programa municipal atende a todas as mulheres que realizam pré-natal pelo SUS. “Os atendimentos incluem ações educativas, preventivas, diagnósticas e de tratamento, que vão desde a clínica ginecológica, o pré-natal, parto e puerpério até o planejamento familiar, ISTs e saúde mental”, explica Ana Paula Martins, assistente social da SMS.
A saúde mental é um dos focos do trabalho multidisciplinar da equipe, que conta com assistente social, enfermeira, nutricionista, psicóloga, médico ginecologista e, quando necessário, psiquiatra. O objetivo é rastrear e tratar precocemente sinais de depressão pós-parto, condição que pode afetar significativamente o bem-estar da mãe e do bebê.
O rastreamento de possíveis sintomas emocionais não espera o nascimento do bebê para começar. “O trabalho inicia ainda no pré-natal. Se a enfermagem identifica algum risco ou indício de depressão, a gestante é encaminhada ao serviço social e à psicologia”, relata Ana Paula. O serviço social realiza uma visita domiciliar, buscando compreender o contexto familiar e social da gestante, enquanto a psicologia dá seguimento ao acompanhamento.
Essa abordagem integrada permite não apenas identificar sinais de sofrimento, mas também fortalecer vínculos familiares e comunitários. “A atenção muitas vezes se concentra só na gestação, no bebê, na amamentação. Mas ali está também uma mulher, uma mãe, uma trabalhadora, tentando se equilibrar em meio a tudo isso”, destaca Ana Paula. Ela reforça a importância do envolvimento dos parceiros: “Costumo dizer em atendimento que ‘pai não ajuda, pai faz obrigação’. É fundamental trabalhar as responsabilidades desses homens nesse contexto familiar.”
Atenção sem prazo fixo
O tempo de acompanhamento no pós-parto não tem limite estabelecido. “O atendimento será oferecido conforme a demanda. Não há um tempo específico para conclusão”, afirma Ana Paula. A continuidade do cuidado é garantida pela articulação com as Unidades Básicas de Saúde e, quando necessário, com o Hospital Montenegro, que também atua no encaminhamento de casos para a SMS.
Doenças como sífilis, HIV, diabetes e a própria depressão pós-parto fazem parte das condições que exigem atenção especial. O planejamento familiar também integra as ações do programa, ajudando mães e casais a organizarem suas vidas de acordo com suas realidades.
Impacto na vida real
Mais do que números, são as histórias e vínculos que mostram os frutos do trabalho. “Muitas mães retornam para agradecer. Já acompanhei mulheres que atendi quando eram crianças e que agora, adultas, me procuram durante a gestação. Isso é o melhor reconhecimento do nosso trabalho”, diz a assistente social, que atua há 25 anos no serviço público municipal.
O atendimento contínuo e humanizado também tem um reflexo importante: muitos pais, inicialmente acompanhantes, acabam se tornando usuários dos serviços de pediatria e buscam orientações junto à equipe da SMS. “Esse vínculo que construímos com as famílias permite uma continuidade do cuidado, tanto coletiva quanto individualmente”, conclui Ana Paula.
Índices de depressão pós-parto são grandes
A Organização Mundial da Saúde estima que cerca de 10% a 15% das mulheres desenvolvem depressão pós-parto em países de alta renda. Em países em desenvolvimento, a taxa pode chegar a 25% ou mais, especialmente em contextos de vulnerabilidade social e acesso limitado a cuidados de saúde mental.
No Brasil, estima-se que 1 em cada 4 mulheres (25%) possa apresentar sintomas depressivos no pós-parto. Um estudo da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com mais de 23 mil mulheres, revelou que 26,3% apresentaram sinais de depressão pós-parto. Muitos casos não são diagnosticados, o que indica que os números reais podem ser ainda maiores.
Sintomas da doença
A depressão pós-parto pode surgir dias ou semanas após o nascimento do bebê e varia em intensidade. Alguns dos sintomas mais comuns incluem:
- tristeza persistente ou sensação de vazio;
- choro frequente sem motivo claro;
- falta de interesse ou prazer em atividades antes prazerosas;
- cansaço extremo, falta de energia;
- sentimentos de culpa, inutilidade ou incapacidade de cuidar do bebê;
- ansiedade excessiva ou ataques de pânico;
- irritabilidade ou raiva desproporcional;
- dificuldade de concentração ou tomada de decisões;
- alterações no sono (insônia ou sonolência excessiva);
- alterações no apetite;
- dificuldade de criar vínculo com o bebê;
- pensamentos de machucar a si mesma ou ao bebê (em casos graves).